Os adolescentes são personagens ainda pouco conhecidos, com todos os avanços da psicologia e da pedagogia, eles ainda são uma incógnita. O período – entre os 12 e 19 anos – é marcado pelo estabelecimento de desejos, vontades e necessidades (que têm início ainda na infância), pela rebeldia contra os pais e a escola, pela tentativa de ampliar os próprios limites. Muitas vezes, estas condutas resvalam para transtornos mentais, mas a linha que delimita o comportamento normal e o comportamento divergente é muito tênue; portanto, pais e educadores devem estar muito atentos.
O transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), por exemplo, é diagnosticado com alguma leviandade. Muitos “gênios” ou superdotados (atualmente, os especialistas preferem classificá-los como “portadores de altas habilidades”) recebem a tarja de hiperativos e o caminho mais rápido para superar esta condição é a prescrição de medicamentos.
É mais fácil medicar do que tratar. O psiquiatra americano Dale Archer, autor de “Better than Normal” (recém-lançado no Brasil, pela Editora Sextante, com o título “Quem Disse que É Bom Ser Normal?”), afirma que estamos patologizando comportamentos normais. Os critérios para o diagnóstico de TDAH, por exemplo, seguem critérios antigos.
É impensável atualmente esperar que uma criança exiba um comportamento passivo: ela está exposta a um número cada vez maior de estímulos e se torna cada vez mais precocemente sujeito de suas próprias ações, podendo exibir comportamentos que não agradem aos adultos, mas, nem por isto, são inadequados.
Outro fator é a necessidade de sucesso que permeia todas as relações sociais: é preciso ser bem sucedido em todas as atividades, agradável, feliz a qualquer preço. O espaço para a tristeza torna-se cada vez menor, mas ser feliz o tempo todo é – este sim – um comportamento patológico. Um amigo que se afasta (por qualquer razão), uma nota ruim em uma prova, a morte do animal de estimação e muitas outras situações são motivos para a tristeza, que deve ser sentida e posteriormente superada.
O que caracteriza os transtornos mentais – na adolescência e em qualquer outro momento da vida – é a intensidade dos sintomas. A doença mental se instala quando a pessoa tem prejuízos, como não poder desenvolver as atividades cotidianas, sente-se inadequado na família e entre amigos, não consegue superar perdas ou persegue modelos impossíveis de serem alcançados. Isto requer atenção dos pais e, muitas vezes, psicoterapia.
Um exemplo disto é o uso de drogas ilícitas: pode se constituir em sinal de dependência química, que requer tratamento imediato, mas também pode ser simples curiosidade, desejo de ser aceito pelo grupo.
O uso de medicamentos é o último recurso e deve ser adotado quando mais de um especialista descreve o mesmo diagnóstico. Existe uma “tentação” séria: entre os resultados da psicoterapia, obtidos no médio prazo, e o remedinho que acalma, torna os jovens educados, dóceis e cordatos, muitos pais se deixam seduzir e partem para a primeira opção, que pode causar sérios danos para o desenvolvimento.
Até o século XVIII, a adolescência era simplesmente ignorada. As transformações físicas e mentais desta importante etapa da vida eram subvalorizadas. As jovens eram encaminhadas o quanto antes para o casamento, antes mesmo da festa de debutante (a apresentação formal para a sociedade, geralmente aos 15 anos, uma adaptação dos ritos de passagem ancestrais). Os rapazes eram encaminhados aos estudos (e também aos bordéis e zonas de prostituição) e gozavam de um pouco mais de “liberdade”, mas o casamento era a saída final, com as responsabilidades de família, emprego, etc. Crianças deixavam a infância e passavam diretamente para a vida adulta.
Os adolescentes ainda são um mistério e muitos exibem transtornos mentais que demandam tratamento urgente. Os mais comuns são os seguintes:
Transtornos de humor
Incluem-se aqui os quadros depressivos, de certo modo comuns na adolescência. Caracterizam-se pela apatia, tristeza, perda de interesse ou prazer pelas atividades diárias, excesso de sono e perda de apetite.
Por outro lado, adolescentes nesta condição podem se mostrar irritadiços, intolerantes, pouco sensíveis ao carinho ou às conversas com familiares. Ganho de peso e insônia também podem estar associados. Muitos adolescentes com transtornos de humor podem tentar compensações com drogas, inicialmente o álcool, muitas vezes estimulado na própria família.
Uso de drogas psicoativas
O uso de drogas na adolescência é bastante conhecido. A maioria dos jovens trava contato com drogas ilícitas (a primeira é a maconha) em ocasiões sociais (mais de 80%) ou na escola (11%). A curiosidade é o principal motivo para a experiência, mas adolescentes que se sentem deslocados podem passar a usá-las como um passaporte para a aceitação pelo grupo.
A maioria dos jovens que experimentam maconha (76%) mantêm-se “fiéis” a ela, não migrando para outras substâncias. A busca incessante pelas drogas, no entanto, acende o sinal amarelo: adolescentes podem passar a subtrair objetos de casa para vendê-los e, com o dinheiro, comprar drogas, que se tornam uma muleta psicológica. Em muitos casos, eles podem se envolver em infrações mais graves para obter o prazer proporcionado, que, no médio prazo, se torna uma compulsão.
O principal problema é o crack, relativamente recente no Brasil. Ele é obtido dos rejeitos da refinação da cocaína e do preparo da maconha para venda. Com a destruição de muitas refinarias de drogas nos países vizinhos, esta “etapa” da operação passou a ser feita aqui mesmo, em muitas cidades, gerando como subproduto o crack, que age rapidamente (atinge receptores nervosos em menos de 20 segundos), mas tem o efeito neutralizado igualmente rápido, o que leve o drogadito a buscar mais “pedras” para fumar. A droga vicia em poucos dias e requer internação para desintoxicação, além de psicoterapia e tratamento medicamentoso.
Transtornos de conduta
São caracterizados pela adoção de condutas inadequadas e mesmo destrutivas. Mais do que “rebeldia juvenil”, como usar determinadas roupas e acessórios, estes transtornos podem levar o jovem à ilegalidade (praticando pequenos delitos, apenas para demonstrar sua “coragem”).
Roubos em casa e em pequenas lojas do bairro, depredações do patrimônio público, brigas (inclusive entre gangues), desobediência sistemática a qualquer autoridade (como pais e professores), crueldade com irmãos menores e animais estão entre os sinais.
Muitos destes comportamentos, no entanto, são reforçados em casa: “filho meu não leva desaforo para casa” é um forte estímulo. Em outros casos, jovens se unem a torcidas organizadas de futebol apenas para legitimar suas brigas (por vezes, verdadeiras batalhas). O tratamento é bastante difícil, já que exige a intervenção não apenas nos sentimentos do jovem, mas também de sua família e grupos (escola, amigos de rua, etc.).
Transtornos de ansiedade
Geralmente, surgem na infância. Entre eles, estão o medo da perda (a separação dos pais, por exemplo) e a fobia escolar (muitas vezes justificada, em função de terem sofrido bullying, que pode gerar situações desmoralizantes ou de impotência e frustração). Não superados, podem gerar transtorno obsessivo compulsivo, síndrome do pânico e muitas fobias.
Estes transtornos podem ser primários ou surgirem combinados com outras situações reais ou imaginárias. Caso não sejam trados adequadamente, na vida adulta serão traduzidos por problemas em todas as esferas: amorosa, familiar, conjugal, profissional, etc.
Transtornos alimentares
Ocorrem mais entre as meninas, mas os garotos também estão suscetíveis a eles. Acontecem a partir de uma falsa autoimagem construída: os jovens se acham gordos ou fracos demais. É o caso da bulimia (ataques compulsivos de fome, geralmente “compensados” com o vômito logo em seguida), anorexia (recusa progressiva de fazer as refeições), ortorexia (preocupação exagerada com os alimentos) e vigorexia (frequência excessiva nos exercícios de malhação, por vezes acompanhada do uso de anabolizantes).
Todos estes comportamentos podem gerar sérios problemas de saúde física e existem casos de adolescentes que foram à morte por causa dos hábitos excessivos. O grande problema está em que, nestes tempos de magreza extrema (para as meninas) e corpo muito sarado (para os rapazes), a família e o grupo social podem incentivar a “busca da perfeição”, sem atentar para os riscos.
Existem outros transtornos mentais comuns a adolescentes, alguns deles graves e geneticamente determinados, como é o caso da esquizofrenia (que, em algum momento, demandará tratamento medicamentoso e grupo de apoio ou internação).
O importante, na maior parte dos casos, é manter o acompanhamento constante e, verificado o desvio de conduta, procurar ajuda o mais rapidamente possível. Diagnosticados precocemente, as doenças podem ser superadas ou controladas, preferencialmente com psicoterapia.