Trata-se do livro mais vendido em todo o mundo, o primeiro a ser impresso, o código de orientação para cristãos (Antigo e Novo Testamentos), judeus e muçulmanos (apenas o Antigo Testamento). É difícil descobrir quem escreveu a Bíblia, mas os textos contidos nela são considerados sagrados e divinamente inspirados. Em outras palavras, para os crentes, a Bíblia foi escrita pelo próprio Deus, que orientou mensageiros e profetas para sua redação.
Os primeiros livros da Bíblia, que tratam da criação do mundo, dos patriarcas, da ida da família de Jacó para o Egito e posterior retorno dos judeus à Palestina, além de alguns trechos dos livros de Juízes, provavelmente foram transmitidos oralmente, de geração em geração, e é possível que tenham sido adotados por outros povos do Oriente Médio.
Os livros restantes que formam a Bíblia, inclusive os que formam o Novo Testamento (os Evangelhos, algumas cartas de apóstolos e o Apocalipse ou Revelação) foram escritos nos mil anos seguintes. São crônicas relatando atos de reis de Israel e Judá, revelações feitas a profetas, descrições de períodos em cativeiro e a história de Jesus.
A Bíblia termina com o Apocalipse, considerado tradicionalmente uma profecia sobre o fim do mundo e o consequente juízo final de todos os seres humanos, vivos e mortos. Este livro é atribuído ao apóstolo João (São João Evangelista, para os católicos), mas a autoria é contestada por estudos comparados de linguística.
Um livro controverso
Vários textos da Bíblia, mesmo assinados, apresentam grande dificuldade para confirmar a autoria. O Livro de Isaías, um dos profetas maiores, cobre um período de 200 anos. Além disto, em sua primeira parte, trata de punições contra os desvios religiosos e os pecados de Israel. Do capítulo 40 em diante, o texto traz mensagens de amor, perdão, conforto e esperança. O livro muda radicalmente de assunto, sugerindo ao menos dois autores.
Isaías é o profeta que mais se aprofunda na vinda do Messias. Ele o descreve como um servo sofredor que morreria pelos pecados da humanidade e como um príncipe que governaria com justiça. No capítulo 53, ele escreve: “ele foi ferido pelas nossas transgressões e moído pelas nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele e, pelas suas pisaduras, fomos sarados”.
É necessária uma explicação: “profetas maiores” é o nome dado aos livros proféticos mais extensos, enquanto os mais curtos são chamados de “profetas menores”. Não se deve confundir com a importância maior ou menor das profecias. O termo “profeta maior” é de origem cristã e, portanto, não consta da Bíblia hebraica.
A própria igreja admite que a “palavra de Deus” foi escrita por mãos humanas; a palavra é sagrada, mas o texto foi redigido por um grande grupo de mortais. Bíblia, aliás, é uma abreviação do nome grego deste livro: “Ta bíblia ta hagia”, que significa “os livros sagrados”.
A tradição religiosa afirma que cada livro foi escrito por um autor claramente identificado: os cinco primeiros livros (Gênese, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio), que formam a Torá judaica e o Pentateuco cristão, teriam sido escritos por Moisés; os Salmos, pelo rei Davi; Juízes, pelo profeta Samuel, e assim por diante.
Muitas religiões acreditam que o conteúdo da Bíblia é literalmente real e não admitem questionamentos. No entanto, no Pentateuco, entretanto, está inserido o relato da morte de Moisés, que, portanto, não poderia tê-lo escrito – ao menos, não em sua totalidade. Em alguns trechos dos cinco livros, Deus é tratado como Yahweh (o próprio nome da divindade, traduzido em português como Javé ou Jeová); em outros, ele é chamado Elohim (simplesmente Deus, um tratamento bastante respeitoso).
Aparentemente, um autor tinha mais proximidade com o Todo Poderoso do que o outro. Historiadores acreditam que os trechos nos quais aparece a palavra Javé são mais antigos; os demais, em que surge o termo Elohim, teriam sido intercalados nas narrativas.
A origem da Bíblia
As histórias contidas na Bíblia derivam de lendas na chamada Terra de Canaã, que compreende Israel, Palestina, Líbano e parte dos territórios do Egito, Síria e Jordânia. Durante muito tempo, acreditou-se que Canaã foi ocupada por muitos séculos pelos hebreus, mas escavações arqueológicas recentes demonstram que a região não compunha um Estado; era uma terra em que vários povos construíram cidades e aldeias. Parte deles ainda era nômade. Os impérios próximos (Suméria, Caldeia, Assíria, Babilônia) usavam o território para conquistar servos sempre que havia necessidade.
Nesse período, é provável que os hebreus fossem um povo politeísta (ou ao menos que acreditasse em um deus nacional, insensível ao apelo de outros povos e até mesmo agindo contra eles). Várias narrativas de guerras falam de Deus batalhando pelo seu povo escolhido.
O monoteísmo só surgiu depois do Cativeiro da Babilônia, quando os judeus retornaram com muitas crenças absorvidas; entre elas, a vinda de um Messias salvador e o dualismo entre o bem e o mal.
É provável que a Bíblia tenha incluído muitas crenças dos cananeus, que viviam na região ao menos desde 5000 a.C. Os períodos de cativeiro na Mesopotâmia ajudaram a compor alguns mitos, como a torre de Babel e o dilúvio universal, também constante da Epopeia de Gilgamesh, considerado o livro mais antigo do mundo.
Existe também uma dicotomia entre a imagem de Deus: em alguns trechos, ele é descrito como misericordioso, justo e dispensador de todos os bens. Em outros, surge um deus belicoso, exigente, sempre pronto a castigar – e até a destruir – os hebreus. O deus sanguinário provavelmente foi composto em períodos de fome e de guerras.
Entre os anos 1000 e 900 a.C., surgiram os primeiros escribas hebreus encarregados de compor a história do seu povo, desde a criação do mundo até o cisma. Estes textos foram escritos depois do reinado de Davi, que teria unificado as 12 tribos hebreias em um reino frágil, dissolvido no governo de seu neto, o rei Roboão. A Bíblia continuou sendo redigida a partir de então por escritores do Reino de Judá (região da atual Jerusalém).
A versão final da Torá foi escrita no século IV a.C., quando um grupo de sacerdotes reformou o Judaísmo. O líder do grupo, Esdras, impunha mandamentos religiosos bastante rígidos, como o veto a alguns alimentos e ao casamento entre judeus e não judeus.
Provavelmente, no texto original do Levítico, consta que não se deve maltratar os estrangeiros, mas, peregrinando na terra prometida, elas devem ser aceitos como se fossem o próprio povo judeu.
Por volta de 200 a.C., todos os textos da Bíblia já estavam compilados. A primeira tradução, em grego, data desta época e foi feita a pedido do rei egípcio Ptolomeu II. Uma lenda da época afirma que ela foi realizada por 72 sábios judeus; por isto, foi chamada de Septuaginta. Posteriormente, surgiram versões em aramaico, a língua franca do Oriente Médio.
Dois séculos depois, surgiu um jovem com ideias renovadas sobre Deus e as relações entre os homens: Jesus. Foi um rabino e não deixou nada escrito. Os Evangelhos foram escritos décadas depois da sua morte na cruz. A maior parte dos relatos sobre a vida de Jesus foi perdida, mas finalmente a Igreja, no século IV, reconheceu os livros oficiais da Bíblia.
Mais influências
A Bíblia influenciou fortemente o mundo islâmico. Os arabescos – combinações elaboradas de elementos geométricos – que ornamentam mesquitas e palácios árabes são derivados de uma determinação bíblica para não representar as coisas que estão na terra, no céu e nas águas. A solução encontrada foi utilizar temas abstratos na decoração.
A arte europeia e bizantina também foi influenciada pela Bíblia. Artistas como Michelangelo, Caravaggio, Leonardo da Vinci retrataram em suas telas e afrescos várias passagens deste livro que é o maior best-seller de todos os tempos. A iconografia bizantina é célebre pelos mosaicos de anjos e santos. Em função de sua posição geográfica, a arte do Império Romano do Oriente absorveu aspectos das culturas romana, grega e do Oriente.