Uma equipe de pesquisadores franco-russa identificou, em agosto de 2015, um novo vírus gigante no nordeste da Sibéria, região norte da Rússia, a 30 metros da superfície. Batizado de “Mollivirus sibericum”, ele não é considerado uma ameaça para os seres humanos – mas, apenas por ter sido encontrado em uma região desértica.
Eles fazem parte dos vírus icosaédricos envelopados, mesma classe do “Influenza” (que transmite a gripe) e dos vírus causadores dos herpes genital e labial.
O nome do novo microrganismo significa “vírus suave da Sibéria”, mas a semelhança da sua estrutura cromossômica com alguns vírus danosos à saúde humana não permite classificá-los como “suaves”. Potencialmente, eles são prejudiciais.
Mais gigantes
Não é o primeiro vírus gigante já encontrado. Em maio de 2014, pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) anunciaram o encontro do SMBV, ou vírus Samba, nas águas do rio Negro (Amazonas), que pode causar pneumonias. Bem antes disto, em 1992, a equipe de saúde do Hospital de Bradford (Inglaterra) identificou o envelope (invólucro) de outro gigante que infecta amebas, seres microscópicos relativamente complexos.
A maioria, no entanto, foi achada nos últimos 12 anos. Um “Mimivirus” foi encontrado, em 2003, nas águas costeiras do Chile e da Austrália. Acredita-se que eles sejam nativos de regiões mais ao norte, mas estão migrando para o sul do oceano Pacífico, que está com as águas mais aquecidas. A Sibéria é a “casa” de outro vírus gigante, encontrado em 2014: o “Phitovirus sibericum” que habita o litoral congelado da região do mar Ártico (o terreno é conhecido como permafrost ou pergelissolo).
As descobertas indicam que os vírus gigantes não são tão raros como se supunha até a década de 1980. Até então, era consenso, entre a comunidade científica, que os vírus, sempre minúsculos, por definição, eram constituídos por poucos genes. O sequenciamento do DNA, porém, mostrou que eles podem ter mais de 600 mil pares de bases, com instruções para criar 500 tipos de proteínas. Os indivíduos do gênero “Pandoravírus”, descritos em 2013, têm até 2.500 genes.
Os indivíduos estão sendo estudados em laboratórios espalhados no mundo todo – e uma das linhas das pesquisas consiste em “ressuscitar” experimentalmente os microrganismos, que podem acelerar o combate às doenças virais. Os “Phitovirus” já foram reanimados, na Universidade de Marselha, na França.
Efeito estufa
O aquecimento global, mais uma vez, pode colocar a nossa saúde em risco: com o derretimento do gelo, a tundra e a taiga da Sibéria ficarão desprotegidas, em um processo conhecido como savanização (transformação da cobertura vegetal em campo, em lugar das coníferas e das gramíneas que se desenvolvem no extremo norte do planeta).
Por enquanto, a maioria dos vírus está em estado de cristalização. O avanço das fronteiras agropecuárias na Rússia (e também no Alasca e Canadá) pode expor grupos humanos à varíola, doença altamente contagiosa causada por “Orthopoxvírus” (um dos maiores já classificados entre os que infectam os seres humanos e outros animais, com 300 nanômetros de diâmetro, ou 0,0003 milímetro), considerado extinto desde a década de 1970.
A elevação do clima não é a única vilã desta história. Técnicos da Rússia, Inglaterra e dos países escandinavos estão prospectando petróleo, gás natural e outros minérios no fundo do Ártico, um local praticamente inexplorado do planeta. A movimentação das águas pode trazer novos microrganismos potencialmente nocivos.
Mania de grandeza
De acordo com a equipe que encontrou o “Mollivirus sibericum”, ele tem 30 mil anos de existência e pode ser identificado com o uso de um microscópio óptico simples (ao contrário dos vírus conhecidos, que exigem o uso de equipamentos eletrônicos para que possam ser analisados). Ele viveu no Período Paleolítico Superior, quando parasitava seres unicelulares.
Ele mede 0,5 mícron (milésimo de milímetro), muito maior do que a maioria dos seus “primos” e é facilmente confundível com uma bactéria. O termo “gigante” foi adotado para adjetivar estes seres que podem ser estudados com microscopia de luz.
Ao contrário dos demais seres vivos, os vírus não morrem. Em condições adversas, eles se transformam em cristais minúsculos, até que a natureza permita que eles consigam parasitar um microrganismo, fungo, vegetal ou animal.
A análise dos estudos indica que os vírus gigantes congelados apresentam grande diversidade. O “Mollivirus sibericum” é a quarta família deste tipo de microrganismo já identificada; nos testes com os germes ressuscitados, houve a preocupação de confirmar que não há risco de infecção, ao menos para os cobaias de laboratório.
Nos ambientes controlados de universidades e estudos de pesquisa científica, portanto, não existe o risco de reanimar os vírus gigantes. Os cientistas precisam atender a diversos protocolos, adotados pela maioria dos países do mundo. Contudo, não se pode descartar um “renascimento” natural, provocado pela elevação da temperatura.
O “Mollivirus sibericum”, para se multiplicar (o termo técnico é “replicar”), precisa invadir o núcleo da célula hospedeira. As demais espécies (“Mimivirus” e “Phitovirus”) encontradas capturam apenas parte do citoplasma. Na verdade, os vírus são apenas trechos de DNA ou RNA, que agem “roubando” material genético para conseguir sobreviver.
Apenas algumas partículas virais podem ser suficientes para causar infecções, caso entrem em contato com um hospedeiro vulnerável. Neste caso, o indivíduo acometido passa a ser automaticamente um transmissor da nova enfermidade. Se a ocupação da Sibéria e do mar Glacial Ártico não for feita com cuidado e racionalidade, existe a possibilidade ao menos teórica de ressurgimento do vírus da varíola, doença conhecida há pelo menos 3.600 anos.
A sequência do código genético foi possível deste vírus gigante da Sibéria foi possível graças a amostras coletadas no nordeste siberiano. O DNA dos vírus estava intacto, congelado pelo eterno inverno do Círculo Polar Ártico.