O movimento do Slow Food – alimentação vagarosa – prega a necessidade de manter a tranquilidade em todos os momentos do dia a dia, tanto profissionais, quanto pessoais. Lanchonetes existem há mais de um século nos EUA e tornaram-se moda no Brasil nos anos 1950, com seus mistos quentes, americanos e baurus, mas eram pontos de encontro principalmente de adolescentes e jovens, que se reuniam para conversar, ouvir música – nas jukeboxes, em que era possível executar os hits do momento com apenas algumas moedas – e, claro, namorar.
Nas décadas seguintes, no entanto, lanchonete tornou-se gradualmente sinônimo de fast food – ou alimentação rápida. As pessoas fazem filas, engolem sanduíches e refrigerantes em alguns minutos e abrem espaço para os próximos consumidores. Em geral, são alimentos de baixa qualidade nutricional, muitas vezes prejudiciais à saúde – com muita gordura e muito sal –, mas o sabor é delicioso.
Quem come um hambúrguer ou mais, turbinados com molhos, muito queijo e batatas fritas, dificilmente sente fome nas quatro ou cinco horas seguintes, e aí está o problema. A refeição é pobre em vitaminas e sais minerais, fator determinante de vários problemas de saúde, e rica em gorduras, responsáveis no médio prazo pela deposição de placas nos vasos sanguíneos, causadores de tromboses, AVC e problemas cardíacos, como infarto do miocárdio e isquemia. Este hábito, quando aliado ao sedentarismo, é um convite para uma vida ruim: na melhor das hipóteses, surgirão gastrites e úlceras gastrointestinais.
O movimento
Nos anos 1980, surgiu a reengenharia, um novo modelo de gestão que, entre outros pontos, preconizava a eliminação de diversos níveis hierárquicos para aumentar a eficiência administrativa. A reengenharia surgiu nos EUA e espalhou-se pelo mundo todo. Diretores e gerentes foram demitidos e profissionais de nível intermediário foram alçados a funções de chefia. Ao mesmo tempo, um “boom” na Bolsa de Valores de Nova York impulsionou a especulação financeira, tornando pequenos investidores em referência no mercado de ações.
Muitos jovens, em pouco tempo, foram alçados de assistentes a executivos e analistas, mas mantiveram seus hábitos, inclusive em função da sobrecarga de trabalho. Não trocaram as lanchonetes e carrinhos de hot-dog por restaurantes à la carte. Criou-se até uma nova etiqueta à mesa, com a faca sendo usada para empurrar o alimento para o garfo, para economizar tempo: foi o primeiro sinal do fast food.
Em 1986, o cozinheiro italiano Carlo Petrini criou o movimento Slow Food, para combater os maus hábitos alimentares. Não por acaso, nesse mesmo ano, o McDonald’s inaugurou uma loja no centro histórico de Roma. O movimento pretende oferecer maiores informações ao consumidor, proteger as tradições culinárias locais, fomentar o cultivo e criação tradicionais da região.
Para o Slow Food, os alimentos devem ser saborosos, acessíveis às populações locais, produzidos com respeito ao meio ambiente e atender às necessidades nutricionais; isto significa preço justo ao consumidor e lucro ao produtor, o que favorece inclusive a biodiversidade: ao valorizar a tradição, em detrimento aos hambúrgueres e fritas, a produção de recursos agropecuários locais é estimulada.
Nada de ingerir muito em pouco tempo: o movimento procura valorizar a refeição como um rito social e profissional: os americanos criaram o ditado “There’s no free lunch” – não existe almoço grátis –, significando que há muitas possibilidades de negócios numa refeição com clientes, mas ela precisa ser vagarosa, para que a conversa siga seu rumo e ofereça boas oportunidades.
As críticas
O Slow Food reúne mais de cem mil pessoas em todo o mundo, mas muitos reclamam de seu caráter elitista. Ao preconizar o consumo de produtos locais, o movimento condena a produção agrária em larga escala, que barateia os alimentos. O Slow Food defende-se dizendo que, ao priorizar o consumo dos alimentos locais e tradicionais, também garante preços mais baratos, já que o transporte de carnes e vegetais não depende de longas distâncias e, portanto, fatores como frete e seguro têm custo menor.
O movimento também inclui o impacto ambiental entre os custos da produção em larga escala. Para o Slow Food, a emissão de metano pelo gado, o desmatamento para abrir novos pastos e áreas agrícolas e os prejuízos consequentes à saúde devem ser levados em conta na hora de calcular o custo real.
Além disto, em muitos países, os trabalhadores rurais vivem em condições precárias, com baixos salários, sem proteção social e até em condições degradantes. Portanto, a matéria prima para os alimentos industriais do fast food seria barateada com a humilhação de seres humanos.
Extremismos à parte, o movimento transmite uma mensagem para todos: reservar o tempo necessário para as refeições, conversando com parentes e amigos, além de favorecer o meio ambiente, faz bem para a saúde física e mental. Basta experimentar uma refeição lenta para verificar os benefícios, que são quase imediatos.