As mulheres falam mais que os homens?

As mulheres falam mais do que os homens. Estudos científicos monitoraram dezenas de grupos de ambos os sexos, utilizando diversas técnicas: grupos de controle (reúne-se um grupo em uma sala fechada e é proposto um tema para discussão), gravações intermitentes (aparelhos captam trechos de 15 a 30 segundos das conversas diárias – com intervalos de ao menos dez minutos, para não expor a intimidade dos voluntários) e a observação direta, pelos pesquisadores, em atividades de rotina (por exemplo, em sala de aula).

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Outra técnica é a verificação do número de intervenções durante uma discussão. Descobriu-se também que crianças pequenas tendem a falar mais quando estão com pessoas em que confiam (e por isso se tornam silenciosas quando são levadas a consultórios dos “nada confiáveis” pediatras).

E foi com crianças que se descobriu este fato: mulheres falam mais que os homens… até os dois anos e meio. E, para tristeza dos machistas, isto é provavelmente devido ao fato de que elas desenvolvem as capacidades cognitivas da fala mais precocemente do que seus coleguinhas do sexo oposto.

Em revisões de pesquisas sobre o controverso tema, chegou-se à conclusão de que os mais falantes são os homens, mas a diferença é muito pequena, estatisticamente desprezível. Os resultados mais consistentes surgiram em situações sociais ou de trabalho; na vida familiar, os homens são mais silenciosos. No total, foram revisados 36 estudos e apenas dois indicaram as mulheres como mais falantes.

Seja como for, a principal conclusão é de que não há parâmetros objetivos – com exceção de meninas pequenas – para constatar quem fala mais. A situação, as pessoas presentes, o nível de ansiedade, a necessidade de projeção, tudo isto muda a forma como nos comunicamos. Falamos muito pouco durante uma audiência com um juiz, por exemplo, do que quando estamos reunidos com amigos. Ninguém precisa desenvolver estudos para concluir isto.

A lenda que mulheres falam mais que os homens

Então, se onde surgiu esta tese “científica e objetiva”, que circulou – e ainda circula – na internet? De apenas um livro, “O Cérebro Feminino”, de Louann Brizendine, neurologista da Universidade da Califórnia em São Francisco (EUA), publicado em 2006. Na obra, a autora afirma que mulheres falam 20 mil palavras por dia, enquanto homens falam apenas sete mil.

Um professor do Departamento de Linguística da Universidade da Pensilvânia, Mark Lieberman, questionou os dados (ele teria chegado a afirmar que os totais de palavras diárias pareciam ter saído de um livro de autoajuda). Brizendine prometeu retirar as afirmações das próximas edições. Lieberman tentou rastrear a informação, mas só encontrou uma referência em um manual sobre convivência conjugal de 1993 – bem distante do que se espera de fonte para pesquisa científica.

A mudança de redação, com a supressão dos números, veio tarde demais; o estrago estava feito: a partir de então, nove entre dez textos sobre diferenças entre o comportamento de homens e mulheres citam a tagarelice feminina com base no livro de Brizendine. Alguns, por falta de cuidado na pesquisa; outras, para demonstrarem “como as mulheres passam o dia falando, enquanto os homens trabalham para sustentar a família”.

Impressões

Se mulheres e homens equivalem no quesito fala, de onde vem a impressão de que as representantes do sexo feminino são mais eloquentes, fato verificado por todos? A história pode trazer alguma luz ao assunto.

Logo nos primeiros grupos humanos, surgiu a divisão social do trabalho: mulheres cuidavam das crianças e da caverna (e posteriormente da horta e dos barracos), enquanto homens organizavam excursões de caça e pesca, para garantir o sustento da taba. Isto os tornou silenciosos – para não afastar as presas – enquanto as mulheres permaneciam conversando, trocando informações, recebendo ordens. Em outras palavras, elas precisavam da palavra para desenvolver as suas atividades, e isto obrigou-as a ampliar o repertório vocabular e a própria capacidade de relacionamento.

A situação continuou. Quando surgiram as primeiras cidades e aldeias, começaram também as primeiras guerras e, para cercar um inimigo, o silêncio era fundamental. Da mesma forma, quando permaneciam nos acampamentos, esperando a ordem de ataque, os guerreiros precisavam ficar quietos, para não denunciar sua posição.

Pode-se imaginar que as mulheres ficavam confortavelmente em casa, mas não era exatamente assim. As famílias dos vitoriosos realmente recebiam seus combatentes com despojos de guerra, mas os derrotados sofriam. Em primeiro lugar, a maioria era executada. As mulheres das aldeias destruídas eram levadas como cativas (em muitos casos, as virgens, em idade reprodutiva, eram usadas como moeda de troca: “levem-nas e deixem-nos com vida”).

Para sobreviver em um ambiente hostil, com atividades desconhecidas, a primeira coisa a se fazer era aprender o novo idioma (inclusive para obedecer às ordens incompreensíveis) e isto pode ter ampliado as capacidades cognitivas, proporcionando o desenvolvimento de algumas regiões do cérebro relacionadas à fala. Arqueólogos encontraram crânios milenares na Turquia, que apontam para estas diferenças cerebrais entre os sexos.

Estas diferenças anatômicas e culturais podem ser as responsáveis pela fala mais “enfeitada” das mulheres, em contraposição ao diálogo masculino, sempre mais conciso. No entanto, as duas formas apresentam benefícios: a “fala curta” dos homens permite a transmite de um número maior de informações, enquanto as mulheres conseguem transmitir mais detalhes e tornam mais fácil a visualização das ideias transmitidas. As duas formas podem ser úteis, de acordo com as atividades desenvolvidas, tanto em casa, como na profissão.