Durante décadas, pais correram para comprar andadores assim que os bebês começavam a ficar em pé no berço, no chiqueirinho ou apoiando-se em paredes e móveis. É uma fase relativamente longa, que começa aos sete meses e se prolonga até o primeiro aniversário. É uma conquista da criança, que ganha autonomia e começa a explorar melhor o seu mundinho. No entanto, pesquisas recentes indicam diversos males do andador, e o principal é atrasar a conquista dos primeiros passos, exatamente o contrário do que se pretende.
O andador pode ser uma solução prática; em vez de atender aos pedidos do bebê, toda vez que ele quer acessar algum local, o equipamento permite que ele se desloque por diversos ambientes, sem necessidade do apoio de familiares. Este é também um grande problema: com a facilidade, desenvolvendo uma velocidade de até um metro por segundo, a criança tem acesso a fogões, piscinas e escadas, o que aumenta o risco de acidentes domésticos.
A pressa do bebê em se deslocar, facilitada pelo andador, também responde por pequenas tragédias: muitas vezes ele cai do próprio equipamento, o que pode significar traumatismos e até fraturas de crânio. Na melhor das hipóteses, o andador oferece uma forma errada de andar; a criança anda sentada, com a coluna vertebral arqueada, demora mais para andar e pode desenvolver desvios ortopédicos que o acompanharão por toda a vida.
Nesta fase, a criança ainda não sabe se apoiar bem sobre os pés, e o andador não contribui para melhorar esta condição: determina que a criança se apoie nos dedos ou nos calcanhares, o que pode provocar fraturas na tíbia e fíbula, os ossos da perna abaixo do joelho ou, em casos menos extremos o famoso pé chato: o atraso na formação da arqueadura dos pés, o que determina futuramente o uso de calçados especiais para corrigir o problema.
Mesmo sem causar acidentes, o andador continua inadequado: retarda o desenvolvimento sensorial e a coordenação motora geral. De acordo com o pedagogo Jean Piaget, a criança se desenvolve em “saltos conceituais”: aprende a sustenta a cabeça, rola, senta-se, arrasta-se, engatinha, fica em pé e finalmente começa a andar.
Com o andador, a criança pula alguns desses estágios, cada um deles relacionado a uma etapa de amadurecimento neurológico. O desenvolvimento natural, sem o uso de equipamentos, permite diversos treinamentos para o equilíbrio, coordenação e autoconhecimento corporal, funções necessárias para que a criança entenda, por exemplo, as funções dos pés.
Basta observar um bebê para entender que, antes de carregar objetos, ele passa dias seguindo observando as mãos e suas articulações, para finalmente pegar uma chupeta ou chocalho. Os atrasos podem significar inclusive dificuldade de fala: a falta de treinamento em cada uma das etapas pode prejudicar o processo de falar e pensar. Toda atividade infantil está correlacionada.
A legislação
No Canadá, a venda e propaganda dos andadores já estão proibidas. Não é permitido nem sequer a publicação de um anúncio classificado, a fim de se desfazer de um andador usado.
Nos EUA e Europa, há movimentos populares para que os parlamentos promulguem leis impedindo a produção e comercialização. A Organização Mundial da Saúde (OMS) ainda não se pronunciou sobre o assunto, fato comum nas instâncias da ONU, quando o tema envolve interesses financeiros: o veto aos andadores pode prejudicar diversos fabricantes e provocar desemprego.
Não existe nada semelhante do Brasil, mas a Sociedade Brasileira de Pediatria não recomenda o uso do andador nesta fase entre o engatinhar e a corrida. Uma opção para o andador é o jumper, também conhecido como pula-sapinho: é uma estação fixa de atividades, em que a criança experimenta os primeiros passos com segurança e muitos modelos vêm acompanhados com uma plataforma de atividades, com cores, sons, formas, etc., que estimulam o desenvolvimento cognitivo.
A melhor forma
Paternidade e maternidade são atribuições vitalícias: não existe um momento em que pai e mãe deixam de se preocupar com os filhos: o que ocorre e que as preocupações mudam à medida que o tempo passa.
Bebês exigem atenção constante – inclusive durante o sono –, alterações no mobiliário e na decoração, com a cobertura de tomadas, atenuação de cantos vivos e retirada de objetos que possam se tornar focos de traumas e contusões.
É preciso estar presente e acompanhar o desenvolvimento, e cada superação exige determinação e muitos percalços. É bom deixar o filho levar alguns “tombinhos”, de preferência em locais protegidos e macios. Aprender a andar é uma das primeiras conquistas do bebê: é preciso acompanhá-la e valorizá-la. Atalhos não favorecem o desenvolvimento, nem a educação.