Na Província de Sichuan, centro-sul da China, acredita-se que a limpeza dos olhos torna a vida mais bonita. No entanto, eles não acreditam que água ou soro sejam suficientes: para esta limpeza, as pessoas se arriscam a ter os globos oculares raspados com lâminas afiadas. A praticamente está desaparecendo lentamente – é oficialmente proibida por lei – mas é possível encontrar barbeiros dispostos a realizar a raspagem por menos de R$ 2,00 (cinco yuans, na moeda local).
De acordo com a tradição de Sichuan, a raspagem dos olhos permite observar melhor a beleza da vida, aproveitar as dádivas da natureza e descobrir nuances dos seres humanos não perceptíveis com o constante depósito de impurezas trazidas pelo vento. A prática da limpeza dos olhos e pálpebras com lâminas é ancestral e, segundo a lenda, foi popularizada pelos irmãos Zhou Chengfu e Zhou Chengyin, cujo pai se destacou na manutenção de olhos, orelhas e gargantas de seus clientes.
A raspagem de olhos está quase extinta, mais ainda é praticada mesmo em cidades modernas, como Changdu, a capital da província, metrópole de cinco milhões de habitantes, famosa pelos monumentos históricos (a cidade foi fundada no século V a.C.). Comerciantes chineses mantêm uma grande carteira de clientes, que mensalmente acorrem às barbearias para terem seus olhos higienizados. Apesar da decadência, eles afirmam que o perigoso ofício continua muito lucrativo. Alguns destes “técnicos” oferecem seus serviços em praças públicas.
Antes de iniciar a limpeza, os barbeiros lavam as navalhas na mesma água usada para lavar as cabeças raspadas dos clientes. Mantendo o olho aberto com a mão esquerda, eles usam a mão direita para direcionar a lâmina em direção ao globo ocular. Em seguida, inserem uma haste de metal sob a pálpebra, num movimento de vaivém, como um limpador de para-brisa. O processo leva cerca de cinco minutos, ao final dos quais os clientes, que dizem não mover nenhum músculo durante a raspagem, estão com o rosto coberto de lágrimas, mas enxergando muito melhor.
Não bastasse o alto risco de acidente envolvido nesta estranha prática, especialmente para os ocidentais, a raspagem dos olhos também pode causar infecções e inflamações, já que as lâminas não são esterilizadas, apenas lavadas numa bacia com a mesma água usada em outras atividades. A navalha é empregada para cortes de cabelos, barba e raspagem.
Mas os barbeiros são rápidos quando são questionados sobre os perigos à saúde: informam prontamente que a navalha fica imersa em álcool durante toda a noite, como se esta providência surtisse algum efeito benéfico. Afirmam ainda que atuam há anos raspando olhos e os clientes nunca apresentaram problemas. O motivo para isto seriam os longos anos de prática antes de se tornarem profissionais, aliados à força e flexibilidade dos pulsos.
No Brasil
A raspagem pode parecer estranha entre nós, mas em Abadiânia (GO), um médium brasileiro, João Teixeira de Faria, conhecido como João de Deus, usa facas de cozinha em suas cirurgias espirituais e realiza o mesmo procedimento chinês: raspa os olhos dos pacientes para eliminar problemas de saúde. Ele é especializado em problemas oculares e de nariz e garganta.
O médium mescla práticas espíritas, católicas e da Nova Era em suas atividades. Sua fama já correu mundo: ele foi entrevistado pela apresentadora americana Oprah Winfrey e também tema de um documentário do Discovery Channel. A cidade tem apenas 13 mil habitantes, mas dispõe de 30 hotéis e atrai turistas brasileiros e do exterior. O paciente célebre mais recente do médium é o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que procurou João de Deus durante seu tratamento contra um câncer na laringe.