Ter o prazer de navegar pelo litoral da Austrália é para poucos. Encontrar um bando de dragões azuis (blue dragon; cientificamente, “Glaucus atlanticus”) nadando – ou melhor, deixando-se arrastar pela correnteza – é um privilégio ainda maior. Na verdade, o dragão azul vive em todas as águas temperadas e tropicais, mas as maiores “frotas” foram identificadas no nordeste australiano. Também são relativamente abundantes na África do Sul (sul e leste) e em Moçambique.
O dragão azul (também chamado de frota azul e andorinha do mar) é uma das espécies dos moluscos nudibrânquios, um grande filo de invertebrados marinhos (que compreende as ostras e as lulas). Os nudibrânquios coloridos costumam habitar águas profundas; apesar de a beleza ser a razão de muitos criadores tentarem levá-los para os aquários, eles simplesmente perdem a cor quando se aproximam da superfície.
Este é o principal motivo da “bênção” de avistar um dragão azul: o bando colore a água com azul-turquesa ou azul-cobalto. Seus parentes mais próximos de nós – as lesmas – não chamam tanta atenção, e às vezes provocam muito asco. Os “atlanticus”, no entanto, são um colírio para os olhos.
Características físicas do dragão azul
A lesminha (o Glaucus atlanticus é uma espécie de lesma pelágica, do latim “pelagos”, que significa “mar aberto”) tem um corpo alongado e achatado, dotado de seis apêndices, que se ramificam em estrelas, com tiras prateadas. Ela é minúscula (apenas três a quatro centímetros, com alguns poucos indivíduos atingindo os oito centímetros), mas, como sempre navega em grandes grupos, provoca um efeito especial na água marinha.
O dragão azul é hermafrodita, apresentando órgãos sexuais masculinos e femininos. Cada espécime produz de quatro a seis cargas de ovos por hora, podendo atingir a produção de nove mil ovos por dia. Ele raramente é visto, porque é dotado com uma bolsa de ar no abdômen (permite a respiração por longos períodos, sem necessidade de vir à tona): quem estiver pensando em avistar um bando, precisa procurar um dia com muito vento, ou logo após uma tempestade.
O dragão azul é uma espécie muito bem adaptada. A coloração escura ventral esconde os espécimes das aves que adoram um sashimi, enquanto o dorso mais claro oculta as lesminhas dos olhares ávidos dos peixes (eles flutuam de barriga para cima). No entanto, evolução é evolução: alguns peixes pelágicos desenvolveram olhos especialmente aptos a identificar e devorar estes moluscos.
O perigo
O prazer intenso, no entanto, fica apenas no olhar. O Glaucus atlanticus é capaz de injetar nematocistos extremamente perigosos através da pele humana (é a sua forma de caça). Os inoculadores ficam nas extremidades das “estrelas”.
Nematocistos são organelas ou cápsulas aderentes presentes em todos os animais celenterados. Estas estruturas se abrem ao toque e liberam substâncias tóxicas (tetramina, histamina, serotonina e hidroxitriptamina), que afetam o sistema nervoso central (SNC) e causam hemólise, erupções cutâneas, insuficiência renal, urticária, bolhas, necrose e muita dor.
Eles não produzem as toxinas naturalmente, mas conseguem armazenar o veneno de suas presas. A peçonha é armazenada nas extremidades justamente para não infectar o próprio dragão azul. Uma curiosidade: os nematocistos podem ser ainda mais perigosos, justamente por estarem armazenados em um único local.
Felizmente, o dragão azul injeta a peçonha muito lentamente para os nossos sentidos. Na verdade, esta é uma estratégia para que as suas presas (principalmente os hidrozoários, como as medusas e caravelas portuguesas) só percebam o perigo quando não há mais nada a fazer.
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