“Faça-se a luz. E a luz se fez”. Assim narra o Livro da Gênese, do Antigo Testamento bíblico, para explicar o começo do universo. Deus determinou e o mundo foi criado. Os seres humanos teriam surgido seis dias depois, prontos e acabados. Para a ciência, porém, a evolução do homem – e de todos os seres – demorou muito mais tempo.
O homem veio do macaco. Esta é uma das “verdades” mais conhecidas sobre a teoria da seleção natural criada por Charles Darwin. Na verdade, isto é uma mentira. Entre as principais curiosidades sobre a evolução, esta é uma das mais propagadas.
Na verdade, quando o naturalista inglês retornou de uma viagem ao redor do mundo convicto de que os seres vivos – os humanos incluídos – são frutos de uma lenta evolução, a teoria foi mal recebida pelos cientistas britânicos; Darwin chegou a ser destratado pelos estudiosos britânicos. A ideia de que os humanos descendem dos macacos foi ventilada por teóricos da Academia Real Inglesa.
Cartazes foram afixados nas ruas de Londres para desmerecer as ideias de Darwin. O cientista estava na contramão da religião cristã, todo-poderosa no século XIX. No entanto, ele nunca disse que o homem descende do macaco: se isto fosse verdade, como seria possível explicar a existência de chimpanzés e gorilas, por exemplo?
A verdadeira história
De acordo com a teoria da evolução, os seres vivos são resultado de uma lenta gradação, em que os espécimes mais bem adaptados conseguem sobreviver e gerar descendência. Um animal ou vegetal que não consiga interagir com o meio ambiente tem menores possibilidades de se desenvolver e, desta forma, não pode transmitir os seus genes para a posteridade.
Darwin não sabia nada sobre genética. As primeiras leis sobre a hereditariedade só foram apresentadas pelo monge Gregor Mendel (o Pai da Genética), em 1865, na Sociedade de História Natural de Brünn, atual Alemanha, mas permaneceram praticamente desconhecidas até o início do século XX.
A teoria da seleção natural afirma apenas que os seres mais bem adaptados permanecem vivos e geram descendência fértil. O “Homo sapiens”, assim como seus primos – gorilas, chimpanzés, bonobos e orangotangos – faz parte de um mesmo ramo do Reino Animal.
Não descendemos dos macacos. Nós e eles fomos gerados em uma mesma experiência biológica – e cada espécie está no auge da evolução, de acordo com as condições determinadas pela natureza. Estudos sobre o DNA (a nossa “identidade” natural) indicam que todos nós somos muito parecidos – a diferença cromossômica é de menos de 1,5%.
Este fato, de acordo com a classificação de Lineu (o sueco que, no século XVIII, estabeleceu em regras gerais a taxonomia para vegetais e animais utilizada até hoje), colocaria os humanos no mesmo gênero dos demais primatas. Troglodytes, Pan e Pongo, as classificações dos nossos “primos”, simplesmente não existem.
Os nativos do Sudeste Asiático estavam certos: eles chamaram o ruivo primata das florestas de “orangotango”; na língua malaia, o termo significa “homem das florestas”. Aparentemente, muito antes de a ciência confirmar, eles já sabiam a verdade.
Uma geração dura mil anos
Na verdade, em 20 gerações (cerca de 600 anos), somamos mais de um milhão de ancestrais. Em termos de evolução, é muito pouco tempo, e isto deve explicar algumas atitudes que mantemos há alguns séculos ou milênios.
Somos perfeitamente bípedes, temos um cérebro complexo e extenso (o órgão corresponde a apenas 2% do peso total do corpo, mas recebe 25% do sangue bombeado pelo coração) e outras particularidades que provavelmente nos fizeram acreditar que somos “os reis da criação”. É mentira, mas nós gostamos de pensar assim.
As intempéries da vida obrigam as espécies a mudar ou a desaparecer (algumas, determinadas pela humanidade, não dão tempo para que determinados vegetais e animais tenham tempo para a adaptação). Algumas mudanças ou alterações sociais e biológicas, no entanto, permaneceram intactas nestes milênios de desenvolvimento do gênero “Homo”. Vamos conferi-las.
Em 1974, foi encontrado um fóssil impressionante na África oriental (no deserto de Afar, Etiópia). O esqueleto bastante preservado, datado de 3,2 milhões de anos, batizado de “Lucy”, demonstrava que aquele ser possuía um cérebro pouco maior do que o dos atuais chimpanzés (um terço do nosso). Ele também não apresentava o sulco semilunar, comum aos primatas, com exceção dos humanos. Lucy, classificada como um “Australopithecus afarensis” apresentava um quadril achatado – indicativo de que estes hominídeos andavam de forma ereta. Aparentemente, estes parentes “andavam” no caminho que nos levou a estes novos caminhos.
Um pouco mais tarde (cerca de dois milhões de anos), os crânios fósseis do “Paranthropus” indicam que ao menos a espécie “boisei”, também do leste africano, tinha uma mandíbula forte o bastante para mastigar qualquer tipo de alimento. Isto teria sido a origem de nossa capacidade de seres onívoros: podemos comer uma folha ou um pedaço de carne dura.
Revoluções tecnológicas
O “Homo habilis”, nosso avô, viveu há cerca de 1,6 milhões de anos. Ereto e habitante das savanas, ele provavelmente teve de conviver com mudanças climáticas drásticas: o rio Nilo, que atualmente deságua no mar Mediterrâneo, fazia uma curva desaparecida em meio ao deserto do Saara e corria até o oceano Atlântico.
O “hábil” do nome da espécie é emblemático. A Terra passava por severas transformações no clima e na topografia. Graças ao seu grande cérebro e às altas habilidades desenvolvidas, o “Homo habilis” conseguiu se manter e garantir descendência – que somos nós.
O “Homo ergaster”, com um cérebro quase igual ao nosso, é provavelmente o primeiro ser a dominar o fogo. Também desenvolveu alguma forma de linguagem, graças a um possível desenvolvimento da vida comunitária. Provavelmente, é algo semelhante à organização social atual dos gorilas e chimpanzés, que já utilizam diversas ferramentas em seu dia a dia.
Em 1984, os cientistas apresentaram o “Homo habilis”, um avô que mostraria uma das formas mais evoluídas da nossa árvore genealógica. Com muito menos pelos (e, consequentemente, muito menos transpiração), o “habilis” conseguia transpor distâncias maiores – e provavelmente deu origem ao “Homo erectus pekinensis” e ao “Homo neanderthalensis”.
Na verdade, o “Homo neanderthalensis” não é uma espécie que tenha sido extinta. Muitos cientistas consideram que a espécie humana atual seja fruto de um cruzamento entre os “sapiens” e os homens de Neandertal europeus, tendo gerado o “Homo sapiens sapiens”: nós mesmos.
Não matarás
Este é um conceito bastante recente. Em termos de evolução, matar faz parte da regra: é matar ou morrer. Estudos recentes demonstram que os seres humanos apresentam músculos robustos na face exatamente para se livrar de murros e socos no rosto.
Ao que tudo indica, a face masculina apresenta ossos mais fortes exatamente para se prevenir contra lesões – inclusive das brigas conjugais. Também ofereceram armas para as guerras – no Oriente, a utilização de armas em uma batalha foi considerado uma desonra durante vários séculos.
A maioria dos primatas á constituída por quadrúmanos – pés e mãos são constituídos com a mesma forma anatômica. A razão disto é que as nossas mãos – olhe para elas – são instrumentos perfeitos de agressão. Antes de proporcionar um perfeito apoio para encaixar e apoiar, nossas mãos foram adaptadas para agredir.
Com o passar do tempo – é o que indica a análise de nossos esqueletos –, os polegares se tornaram mais flexíveis, permitindo o fechamento perfeito das mãos. É provável que o mesmo mecanismo tenha deixado os dedos dos pés menores que o “dedão”: trata-se de uma ferramenta perfeita para desferir chutes e pontapés.
Pés e mãos, com a capacidade de criar e matar – podemos cruzar longas distâncias, usar ferramentas para plantar, criar animais ou desenvolver novas tecnologias –, são as nossas ferramentas principais para interferir no mundo.