Por muito tempo, a adolescência foi simplesmente ignorada. As alterações hormonais seguintes à puberdade eram vistas como “ingresso na vida adulta”. Muitas sociedades desenvolveram ritos de passagem por volta dos 12, 13 anos. As transformações emocionais, no entanto, eram subestimadas. Há pouco mais de cem anos, estes seres estranhos – os adolescentes – foram finalmente descobertos, e pode não ser nada fácil lidar com eles.
Enquanto crianças, nós queremos descobrir e ampliar nossos limites físicos; é possível verificar isto ainda no berço. Os adolescentes querem testar os limites da mente e do corpo. Já são relativamente independentes, desenvolvem interesses próprios, mas ainda precisam dos pais – por questões financeiras e também porque ainda não sabem tudo (aliás, os adultos também não sabem, mas os mais bem ajustados conseguem lidar com suas limitações).
Muitos adolescentes sofrem da síndrome do super-herói; desenvolvem um sentido de onipotência e começam a colecionar as primeiras frustrações: “ai, a primeira festa, a primeira fresta, o primeiro amor”, como diz Chico Buarque. As primeiras experiências amorosas – sexo incluído – são acompanhadas pela queda do rendimento escolar e algum nível de isolamento da família – que pode ir da recusa em visitar aquela tia distante até a recusa de sair do quarto ou de se desconectar.
São alterações normais, mesmo que acompanhadas de irritação e agressividade, mas é preciso que os pais estejam atentos; nesta época, alguns traumas podem gerar problemas sérios, como depressão. É também na adolescência que surgem eventuais sintomas de problemas mentais.
Estas reações têm duas origens: as alterações hormonais determinam alterações secundárias no corpo – crescimento de pelos, alterações na voz, aumento da massa muscular, desenvolvimento de mamas e dos órgãos sexuais, as primeiras menstruações e ejaculações – e tudo isto provoca a alteração na identidade, na forma como o indivíduo passa a se enxergar; esta é a segunda causa: a mente passa a ter novas aspirações e necessidades.
Os pais precisam estar mais próximos neste período. Se, durante a infância, o relacionamento é ditado pelas determinações: “vá dormir”, “se não comer tudo, não tem sobremesa”, “só pode brincar depois de terminar o dever de casa”, etc., a adolescência é o momento de partilhar. Os jovens já têm uma estrutura psicológica bem delineada e o “porque sim” ou “porque eu estou mandando” já não funcionam mais – e podem inclusive provocar resultados opostos aos desejados.
Mesmo assim, a relação entre pais e filhos continua sendo vertical: pais são provedores e orientadores, filhos são os seres que estão aprendendo a conhecer a vida. Não se trata de amizade (que pressupõe interesses semelhantes), mas de ensino e aprendizado.
A escola
É preciso que os educadores estejam preparados para lidar com adolescentes. O menino dócil, sorridente e atento às orientações do professor em pouco tempo se torna arredio; a menina, que disputava os primeiros lugares da turma, começa a se preocupar mais intensamente com a beleza e a moda.
Em ambos os casos, as redes sociais, a paquera, os primeiros passeios sem o acompanhamento dos pais gera queda de rendimento; convenhamos, é difícil, para a álgebra, competir com o clipe da banda da moda.
A escola precisa se adaptar. As atividades que envolvem mais de uma disciplina são muito bem-vindas. Debates em grupo devem ser estimulados (mas sem forçar a participação dos mais tímidos, que merecem outra abordagem). Usar o teatro e a música nas aulas pode ser um desafio e, ao mesmo tempo um prazer.
O sexo
Neste capítulo, são dois os problemas principais: a precocidade e os atrasos. O início precoce é preocupante: DSTs e gravidez são preocupantes, mas o próprio início da vida sexual traz alterações no comportamento. Para o adolescente, fica claro que namorar é transar são atividades muito mais importantes do que estudar ou relacionar-se com os pais e irmãos.
Por outro lado, há também um grande número de jovens que não consegue estabelecer relacionamentos com o sexo oposto, por timidez ou vergonha do corpo. Este pode ser um período bastante turbulento. Pode ocorrer bullying (chamar garotos e garotas de BV – boca virgem – pode ser traumatizante) e, em qualquer caso, muitos conflitos íntimos se instalam.
Os erros
Muitos pais continuam a crer que seus filhos continuam sendo “seus bebês”. A adolescência, no entanto, é o período de testar a autonomia – e, para isto, é necessário o afastamento dos pais. Isto não significa que os filhos estejam gostando menos dos pais; apenas estão se conhecendo mais e precisam de tempo para assimilar as transformações. Os pais devem permitir novas experiências, sem abrir mão da autoridade. Isto é absolutamente necessário para a construção da identidade.
Pais possessivos tendem também a constranger os filhos. Tentam infantilizar os adolescentes, pedindo, por exemplo, que eles mostrem para a avó o trabalho em que tiraram dez ou a música que cantaram na última festa da escola. Isto não deve ser feito nem com crianças pequenas (para não embotar a naturalidade). Entre adolescentes, o efeito é semelhante ao de uma bomba: eles ficam envergonhados e não sabem o que fazer. Pior ainda é “entregar” pequenos segredos, como o primeiro beijo (muitos pais se vangloriam de ter um filho machão, mas adotam comportamento oposto em relação às meninas).
Na paixão de conhecer o mundo, os filhos geralmente percorrem os mesmos caminhos de todos os seres (“assim caminha a humanidade”). No entanto, para eles, as descobertas são absolutamente inéditas e pessoais. A primeira desilusão amorosa é única e gera uma dor que aparentemente nunca vai passar. O erro está em conselhos do tipo ”Isto vai passar, já aconteceu comigo”. A experiência pode ser semelhante, a forma como o adolescente vai tratar do problema é exclusiva.
Muitos pais dão liberdade excessiva aos filhos adolescentes, que acham não ter mais necessidade de controle. Ledo engano: eles continuam precisando de orientação: horários para chegar, tempo para estudar e muito diálogo são importantes, sem julgamentos, nem acusações.
Adolescentes podem ficar de castigo e ter regalias suspensas. O importante é que eles saibam por que estão sendo punidos. Isso não gera traumas nem vai provocar fugas de casa. Mas, se as cobranças são necessárias, o carinho, troca de ideias, momentos de lazer e diversão não devem ser desprezados.
Seja como for, um grande erro é ameaçar: se o filho cometeu um erro grave e merece ter a mesada cancelada, simplesmente deve ser informado de que não vai receber nada na semana. Para o adolescente, a ameaça funciona se forma semelhante à reação de uma criança que vive sendo ameaçada de ir para o castigo e nunca vai: o resultado é nulo e compromete a autoridade paterna.
Pais querem que os filhos tenham um bom futuro, estudem, tenham boas companhias. Porém, é um erro imaginar que eles vão sair de casa e se envolver com más companhias. Na verdade, só se envolve com pessoas inadequadas quem também apresenta inadequações. Com os devidos cuidados, pode-se permitir que o filho vá a uma festa até mais tarde, durma na casa de um amigo, viaje com outra família. O importante é certificar-se onde e com quem sempre. Não é prova de desconfiança, mas de cuidado. E adolescentes, por mais que neguem, gostam muito dos cuidados dos pais.
Adolescentes dão problemas. Eles estão sempre procurando novas experiências e muitas delas resultam em resultados ruins. Os pais devem aprender a “regra do termômetro”: o problema não é a febre, mas a gravidade. Uma coisa é o filho chegar em casa com odor alcoólico (“febre” de 37°C), outra é ser chamado com urgência ao hospital, porque ele entrou em coma (“febre” de 40°C). A ressaca é um bom professor: a conversa sobre o assunto deve ficar para depois de os efeitos passarem.
A adolescência é um período de transição. O adulto bem ajustado nasce do adolescente que foi assistido e amparado por pais e professores atentos a carinhosos. É importante lembrar que nós criamos filhos para o mundo, e não para nós mesmos. A adolescência é, de certa forma, o início de uma despedida – e isto faz parte dos ciclos da vida.