A hipnose é um instrumento poderoso em tratamentos odontológicos, nos cuidados paliativos para pacientes terminais com câncer e auxilia a enfrentar a depressão e fobias. Durante o transe hipnótico, o cérebro mantém alta atividade psíquica, o paciente pode ver coisas que não existem ou deixar de ver coisas reais. Numa sessão, o objetivo é o relaxamento, obtido através da fixação do olhar num objeto qualquer ou da atenção nas palavras do terapeuta.
Ao contrário do imaginário popular, o hipnotizador não é aquela figura sinistra, que, com um relógio de bolso em movimentos pendulares, domina a vontade do paciente. Na verdade, o hipnotizado está super atento e não realiza nenhuma ação contra a sua vontade: ele mantém seu livre arbítrio durante toda a sessão.
Não é uma situação incomum. Ao ler um livro, dirigir um carro, assistir a um filme ou realizar diversas tarefas domésticas, as pessoas se desligam dos estímulos externos, concentrando a atenção na atividade. Isto demonstra que o transe é um estado de alta atividade cerebral, mas divorciada da influência do meio.
Quando a pessoa está relaxada, o cérebro manda informações para aumentar a liberação de serotonina, neurotransmissor relacionado à sensação de bem estar, ao apetite, ao sono e à secreção de alguns hormônios. A serotonina é utilizada no tratamento de enxaqueca, obesidade, depressão, ansiedade e esquizofrenia; ao ser liberada naturalmente pela hipnose (e não pela administração de medicamentos), ela tem a vantagem de não ocorrer uma depleção posterior, ou seja, a queda brusca do neurotransmissor no organismo, fato que provoca cansaço, inapetência e muita fome.
A hipnose também age aumentando a produção de noradrenalina, também responsável por alterações semelhantes às promovidas pela serotonina. Este neurotransmissor fortalece o sistema imunológico, fortalecendo o combate a diversas doenças. Apesar de muito abusada por charlatães em espetáculos teatrais, a técnica realmente consegue “enganar” o cérebro, neutralizando dores tão severas a ponto de poder ser empregada como anestésico.
Nos papiros de Ebbers, uma compilação médica de textos egípcios organizada em 1550 a.C. (atualmente em exibição na Universidade de Leipzig, Alemanha), já existem indicações sobre o uso terapêutico da hipnose. No século XI, enquanto os europeus medievais caçavam bruxas e gatos pretos, o médico e filósofo árabe Avicena, escreveu “O Livro da Cura” e “O Cânone da Medicina”, tratados sobre diversas técnicas para promover a saúde física e mental, entre eles a hipnose. Os livros de Avicena continuaram sendo estudados em universidades da Europa até o século XVII.
No século XVIII, o médico austríaco Franz Mesmer criou um tratamento mesclando música e hipnose. Ele acreditava que o “magnetismo animal”, uma espécie de energia comum a todos os seres vivos, podia ser utilizado para a cura. Posteriormente, comprovou-se que tal energia não existia, mas o tratamento com a imposição de mãos continuou a ser utilizado por diversas correntes esotéricas. Mesmerismo se tornou sinônimo de hipnotismo.
No século XIX, o médico escocês James Braid criou o termo “hipnotismo” para definir a técnica, por acreditar que o transe era uma espécie de sono induzido. Ele mesmo reconheceu o equívoco, já que o cérebro registra intensa atividade durante o transe, mas a palavra, derivada do deus do sono grego, Hipnos, já tinha caído no gosto popular: a imprensa veiculava diversas matérias sobre os poderes da hipnose.
No início do século XX, Ivan Pavlov, médico russo que criou a teoria do reflexo condicionado, espécie de resposta padrão a determinados estímulos, tornou-se o primeiro cientista a estudar a hipnose sob o ponto de vista fisiológico. Pavlov descobriu que o transe é uma estratégia natural do sistema nervoso central, para se proteger do excesso de informações do meio: quando “bombardeado” em exagero, o contato com o exterior é simplesmente desligado, para se preservar.
Em 1998, veio a comprovação científica da hipnose. Pesquisadores da Universidade Harvard (EUA) submeteram voluntários em transe a exames de tomografia computadorizada do cérebro. Os pacientes foram apresentados a imagens em preto e branco e todos afirmaram que eram coloridas, depois que o hipnotizador ativou a área do cérebro responsável pela captação das cores.
Na hipnose induzida, o paciente fica relaxado e desinibido. Com isto, torna-se mais suscetível às sugestões do terapeuta, que consegue acessar o inconsciente da pessoa, identificando traumas e medos íntimos, para poder tratá-los, auxiliando o paciente a superá-los e obter melhor qualidade de vida.