Em alguns períodos, a história parece ficar estagnada. Nada de surpreendente parece acontecer, os dias parecem se repetir sempre da mesma forma. Mas não foi isto que aconteceu em 1989. Entre outros fatos, o Brasil realizou a primeira eleição presidencial desde 1960, surgiu a world wide web (www, a hoje popular internet), morreram o escritor Samuel Beckett e o pintor Salvador Dali. O fato mais importante do ano – e da história recente – foi a queda do Muro de Berlim.
Em 1961, a então União Soviética, que controlava o lado oriental da Alemanha – a grande derrotada na Segunda Guerra Mundial, encerrada em 1945, propôs ao mundo uma “solução inédita”: Berlim, a antiga capital do Terceiro Reich, expressão utilizada para designar o Estado nazista, foi dividida em dois setores por um muro.
De um lado, ficaram os capitalistas, com os EUA à frente. De outro lado, os socialistas. Em 13 de agosto, os alemães e os soldados franceses, ingleses e americanos foram surpreendidos por um imenso gradeamento metálico de mais de 66 km de extensão (posteriormente substituído por uma muralha de concreto). Os russos instalaram 302 postos de observação e uma avenida perimetral, onde corriam carros, soldados e cães de guarda.
Antecedentes
Com o fim da Primeira Guerra Mundial, em 1918, a Europa assistiu à ascensão de diversos regimes autoritários. Portugal, Espanha, Polônia, Áustria e Hungria, entre outros países, implantaram ditaduras de direita, coma anuência de potências como a França e a Inglaterra.
As políticas mais extremistas, no entanto, foram implantadas na Itália e Alemanha: respectivamente, fascismo e nazismo. Nos anos 1920, os dois países mergulharam em hiperinflação, desemprego e estagnação da produção industrial. Benito Mussolini e Adolf Hitler lideraram o processo de recuperação econômica e granjearam a simpatia da população.
A Alemanha nazista, porém, desenvolveu o conceito de “espaço vital”. Em 1938, os alemães anexaram a Áustria, em um episódio conhecido como Anchluss. No ano seguinte, depois de muitas tensões diplomáticas, os nazistas invadiram o Corredor Polonês.
Trata-se de uma estreita faixa de terra, com 150 km de extensão, na fronteira entre Alemanha e Polônia. Originalmente, o território pertencia à Alemanha, que teve de entregá-lo por imposição do Tratado de Versalhes, que determinou as condições para aceitar a derrota alemã na Primeira Guerra.
Em 1° de setembro de 1939, depois de um ultimato exigindo a devolução, a Alemanha retomou o controle do corredor.
Foi a senha para que a Tríplice Entente – coalizão entre França, Inglaterra e União Soviética – entrasse no conflito, que durou seis anos e espalhou-se pela Ásia, África e Oceania. Em 1941, um ataque do Japão, que junto com a Itália e Alemanha, formava o Eixo, à base naval de Pearl Harbor (Oahu, Havaí) determinou a entrada dos EUA na guerra.
Em maio de 1945, Alemanha e Itália tiveram que se render. Em agosto, depois da deflagração de duas bombas atômicas – os únicos artefatos do gênero já utilizados em conflitos entre as nações –, o Japão também pediu um armistício.
A Alemanha foi dividida em dois países: a República Democrática Alemã (oriental), controlada pela União Soviética, e a República Federal Alemã (ocidental), controlada por França, Inglaterra e EUA. Esta situação perdurou até 1990, ano em que finalmente ocorreu a reunificação.
De volta ao muro
Com a divisão do país, Berlim também ficou dividida. Bonn, que havia sido declarada sede provisória do governo em 1949, tornou-se oficialmente a capital da Alemanha Ocidental. A divisão física da Alemanha teve uma motivação simples: o lado ocidental recuperava-se mais rapidamente dos efeitos da guerra.
No final dos anos 1950, a Alemanha Ocidental apresentava bons índices econômicos e os fantasmas da guerra haviam sido exorcizados. A preocupação do lado oriental e da União Soviética era com um fuga em massa dos moradores.
Antes da construção, já havia muitas restrições para a passagem entre os dois lados de Berlim. Os cidadãos só podiam cruzar a fronteira através do Portão de Brandemburgo e tinham que portar passaporte. Famílias foram separadas e muitas pessoas perderam o emprego, por não poder se mover com agilidade de um setor para outro da cidade.
A queda
Em 1985, Mikhail Gorbatchev assumiu o cargo de secretário geral do Partido Comunista da União Soviética. O novo líder implantou uma série de medidas políticas e econômicas, conhecidas como Glasnost e Perestroika.
Gorbatchev conduziu um processo de distensão com o Ocidente. Assinou tratados com os EUA (Ronald Reagan e George Bush) para redução dos arsenais nucleares, retirou as forças soviéticas do Afeganistão (após dez anos de ocupação) e anulou a condição da União Soviética enquanto Estado socialista.
O líder soviético comprometeu-se, em tratados com países integrantes da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) a não interferir nos assuntos internos dos demais países socialistas europeus: Polônia, Alemanha Oriental, Checoslováquia, Hungria, Romênia e Bulgária. A Iugoslávia e Albânia, também socialistas, não faziam parte da esfera de influência da União Soviética.
Aproximando-se do Ocidente, Gorbatchev encerrou a Guerra Fria, período entre 1945 e 1990 marcado pelos conflitos entre EUA e URSS, que desenvolviam estratégias para minar o adversário e aumentar seu raio de subordinação. A expressão é uma indicação de que nunca houve conflito direto entre as duas potências.
O Muro de Berlim, no entanto, continuou resistindo. Mais de quatro anos depois da ascensão de Gorbatchev ao poder, o símbolo da divisão entre capitalistas e socialistas continuava sinalizando a guerra das ideologias.
Em 9 de novembro de 1989, a construção da desunião finalmente veio abaixo. A Alemanha foi reunificada e a capital voltou a ser Berlim, sem divisões. Com esta notícia, os habitantes dos dois lados “atacaram” o muro com marretas, martelos e até com mãos nuas.
O legado
Passaram-se 25 anos. A Alemanha deixou de ser um país pobre e cindido para se tornar líder do continente e da União Europeia. No entanto, ainda são visíveis as diferenças entre os lado leste e oeste do país. O lado ocidental iniciou a recuperação econômica ainda nos anos 1940, graças ao Plano Marshall.
Este plano deveria abranger a recuperação de todo o continente europeu, mas Joseph Stalin, dirigente da União Soviética, recusou-se a participar da cúpula internacional – e impediu que os presidentes dos países sob a sua influência comparecessem à reunião.
O Plano Marshall foi fundamental para a reconstrução, especialmente da França, Itália e Alemanha Ocidental, países mais atingidos pelos conflitos da Segunda Guerra, mas diversos outros países do continente foram beneficiados.
O lado oriental da Alemanha se ressente até hoje desta disparidade. Atualmente, 67% do PIB do país são produzidos no lado ocidental. O índice de desemprego é um terço mais elevado no leste e os salários, 20% mais altos no oeste.
O governo alemão vem desenvolvendo diversas estratégias para equiparar a situação dos dois lados. Existe outro problemas, porém: muitos jovens fugiram da Alemanha Oriental – ou morreram tentando –, entre 1945 e 1989. Com isto, a população local está mais velha: em 2030, um terço terá mais de 65 anos. Desta forma, além de fomentar a geração de empregos, é preciso estabelecer políticas públicas para atendimento dos cidadãos que atingiram a terceira idade.