A histeria coletiva é um distúrbio emocional em que um grupo passa a apresentar sintomas mentais sem causa aparente, tais como crises descontroladas de riso, danças em plena rua, comportamentos bizarros como tirar as roupas ou cantar sem parar. Os fenômenos podem ser seguidos de cansaço físico, tonturas, náuseas, febre, desmaios, falta de ar, etc.
Também chamada de doença psicogênica de massa, a histeria coletiva é mais comum em grupos fechados – vários casos relatados ocorreram em colégios internos e conventos. Um indivíduo passa a apresentar os desequilíbrios e aparentemente passa a ser imitado pelos colegas. Trata-se de uma resposta solidária bastante exagerada a um fato real ou imaginário.
Casos bastante bizarros de histeria coletiva já foram documentados por médicos e psicólogos ao menos desde o século XVIII, mas há relatos medievais indicando que o problema era comum naquela época, especialmente nas pequenas aldeias europeias.
Dançando até cair
Em 1518, uma mulher começou a dançar pelas ruas de Estrasburgo (atual França; à época, a cidade fazia parte do Sacro Império Romano-Germânico). O fato é bem documentado por observações médicas, notas oficiais do conselho municipal, crônicas regionais e até sermões durante as missas daquele período.
A primeira dançarina, Frau Troffea, contagiou rapidamente os vizinhos. Depois de bailar ininterruptamente por seis dias, ela já tinha a companhia de mais de 30 pessoas; em um mês, mais de 400 acompanhavam os passos da dança. Os médicos descartaram quaisquer causas astrológicas ou sobrenaturais, alegando que se tratava “de uma doença natural, causada por sangue quente”.
O tratamento indicado foi “continuar dançando”. Foram construídos dois salões no local da primeira dança e músicos chegaram ser contratados pelas autoridades, crentes em que a cura só viria se todos continuassem dançando sem parar. Alguns afetados foram encaminhados para um santuário próximo a Estrasburgo para buscar o tratamento necessário – que, naturalmente, não mostrou nenhuma eficácia.
Feitiços e feiticeiras
Em 1692, duas garotas de nove e onze anos passaram a apresentar convulsões violentas e espasmos. As meninas também gritavam sem parar. Isto ocorreu em Salém, Massachusetts (EUA). Um médico foi chamado para avaliar o quadro e o diagnóstico foi “rápido e certeiro”: as jovens haviam sido enfeitiçadas. A afirmação do médico foi o suficiente para que muitas crianças da região começassem a sofrer com os mesmos sintomas.
A culpa recaiu sobre Tituba, uma escrava da família pretensamente envolvida com vodu. Ela e outras mulheres foram levadas a julgamento. Para tentar se livrar, Tituba transformou-se em informante: delatou muitas outras bruxas que atuavam na região. A moça chegou a afirmar que o próprio Diabo circulava entre os moradores de Salém. O caos estava instalado.
O terror público estendeu-se por mais de um ano. Mais de 150 pessoas foram presas e 20 delas foram condenadas à forca (apenas um homem entre os réus, Giles Corey, foi executado). O local das mortes ficou conhecido como “a colina da morte”. Anos mais tarde, Samuel Sewall, juiz responsável por esta caça às bruxas, reconheceu que as sentenças foram um equívoco, já que não havia provas suficientes para incriminar os suspeitos.
Freiras e gatos
No supersticioso sécul0 XVIII, em Paris (França), houve uma campanha para o extermínio de gatos. Os bichanos, especialmente de pelagem preta, eram associados às terríveis bruxas, sempre perseguidas pelo Estado e pela Igreja.
Neste mundo cheio de mitos e crenças, certa manhã uma freira amanheceu miando. Ela contou às superioras que havia sido atacada na noite anterior pelo gato do convento – que evidentemente era preto. Ao servir leite para o bichano, ela foi mordida; logo em seguida, o animal desapareceu, provavelmente em função de artes dos poderes do mal.
Em poucos dias, a freira já não conseguia nem fazer as suas preces: os miados a impediam. A praga se espalhou rapidamente: todas as irmãs de caridade foram tomadas pelo misterioso encanto, a ponto de terem de ser isoladas, sem permissão para deixar os muros do convento; as autoridades entendiam que assim conseguiriam barrar a epidemia de miados.
Nada parecia conseguir neutralizar a histeria coletiva. Depois de algumas noites mal dormidas, um grupo de soldados foi enviado para exorcizar os demônios que controlavam as freiras. Armados com porretes, correntes e chicotes, os militares espancaram as vítimas até que finalmente a epidemia cedeu frente a esta “terapia” pouco ortodoxa.
Vampiros à solta
Em 1975, na cidade de Moca (Porto Rico), espalhou-se o rumor a respeito de uma criatura misteriosa que sugava o sangue dos animais. Moradores identificaram guinchos e bater de asas concomitantes aos ataques. O monstro foi batizado de “Vampiro de Moca”, mas as carcaças examinadas indicaram ação humana, de serpentes e morcegos.
A história esfriou, mas, 20 anos depois, novas notícias pipocaram na Nicarágua, México, EUA e Brasil. Desta vez, a predileção da fera era por cabras e rapidamente espalharam-se casos de ataques do “chupa-cabra”. Ele era descrito como um grande rato de olhos arregalados. As patas traseiras eram semelhantes às de um canguru, o que facilitaria as escapadas. Até hoje, no interior do país, centenas de pessoas afirmam ter topado com o monstro, que chegou inclusive a ser o motivo do cancelamento de comemorações noturnas.
Coca-Cola do mal
Em 1999, a imprensa belga começou a noticiar centenas de “envenenamentos por Coca-Cola”. Crianças chegaram a ser hospitalizadas e muitos jovens apresentaram vômitos e náuseas depois de ter consumido o produto. Havia relatos de odor muito forte nas latas do produto.
O Ministério da Saúde da Bélgica mandou retirar o produto dos supermercados e lanchonetes: foi o maior recolhimento da bebida em toda a história da mais que centenária Coca-Cola. Mais de 15 milhões de garrafas e latas foram recolhidas.
Posteriormente, exames indicaram a presença de um fungicida na parte externa de um pequeno lote de latas, que não poderia ter afetado tantas pessoas. Provavelmente, um lojista com poucas noções de higiene teria aplicado o produto tóxico junto à gôndola do mercado e consumidores tomaram a Coca-Cola sem lavar as latas. Os exames do ministério também confirmaram que a quantidade de fungicida presente seria insuficiente para causar as intoxicações. Nada foi encontrado nas garrafas e a explicação foi uma só: um caso de histeria coletiva.
Morangos indigestos
“Morangos com Açúcar” foi uma telenovela portuguesa dirigida ao público jovem, exibida entre 2003 e 2012. Foi um grande sucesso entre os adolescentes e chegou a ser transmitida no Brasil, mas sem os mesmos resultados – o formato é muito semelhante ao de “Malhação”, exibida pela Rede Globo de Televisão desde 1995.
Em maio de 2006, foi ao ar uma sequência que apresentava vários atores afetados por uma doença cujos principais sintomas eram dificuldade para respirar, erupções cutâneas e tonturas. Os personagens de “Morangos” estudavam na mesma escola.
Dias depois, 43 jovens de uma escola em Caneças, região metropolitana de Lisboa, apresentaram os mesmos sintomas e tiveram que ser internados. Nenhum diagnóstico de alergia foi confirmado, o que não impediu que a “epidemia” atingisse outras escolas – algumas delas tiveram que suspender as aulas. No total, 300 estudantes foram atingidos.
Uma explicação provável: os doentes desenvolveram uma atitude psicológica mimética (de imitação), como meio de encontrar uma forma alternativa de conduta e burlar as muitas proibições da família e dos professores, como o veto ao fumo, às bebidas alcoólicas, ao uso de piercings, etc.