Pesquisadores médicos – muitos deles, respeitáveis – já se aventuraram por caminhos muito estranhos em suas pesquisas. Na Medicina, as descobertas mais bizarras envolvem desde a possibilidade de contrair doenças sexualmente transmissíveis com uma boneca inflável, até os benefícios de uma volta na montanha russa para asmáticos.
No imaginário popular, é comum pensar que a humanidade atingiu o seu atual estágio de desenvolvimento graças ao trabalho incansável de cientistas, que tiveram de enfrentar a ignorância e os preconceitos de seu tempo para fazer triunfar a ciência. A verdade, no entanto, é muito mais complexa – e também muito mais engraçada.
O fundador da Medicina alopática
A humanidade sempre se serviu dos princípios de ervas, raízes e frutos para amenizar ou curar seus problemas físicos. Eles continuam na moda até hoje, com os laboratórios produzindo diversos medicamentos a partir da fitoterapia.
Mas deve ter sido um susto quando alguém resolveu obter princípios químicos, combiná-los e apresenta-los em forma de drágeas, xaropes e soluções. Isto ocorreu no século XVI, com o cientista e alquimista suíço Paracelso. Ele também inovou ao afirmar que o corpo humano era constituído pelos mesmos elementos que formam as estrelas e todos os corpos do universo.
Mas, como dissemos, ele também era alquimista. Uma de suas experiências consistiu em tentar obter um ser vivo a partir de sêmen e estrume de cavalo (e ele garantir ter obtido êxito na empreitada). Outro conceito é que os sete planetas e sete metais (conhecidos à época) estavam representados em nosso corpo pelos sete órgãos principais.
As excentricidades de Paracelso provavelmente são uma das razões para o atraso no desenvolvimento da ciência – ninguém podia acreditar em suas teorias, que pareciam muito fantasiosas. Mas ele certamente foi um gênio que antecipou, ainda que de formas muito bizarras, os conhecimentos da Medicina surgidos apenas no século XIX.
Pólvora para a imortalidade
Os chineses deram muitas contribuições à humanidade – da seda à pólvora. No entanto, eles não estavam interessados em produzir armas de alto poder destrutivo – fato que ocorreu apenas na Europa, no século XIV, com o retorno do italiano Marco Polo e suas novidades sobre os avanços da ciência do Extremo Oriente.
Na verdade, o objetivo dos chineses com a pólvora era muito mais ousado: obter, nada mais, nada menos, do que a imortalidade. No ano 850, a realeza daquele país queria viver para sempre e os alquimistas da corte foram encarregados de encontrar a solução. Uma das receitas foi a mistura de enxofre e sais como nitrato de sódio ou de potássio. Só conseguiram explosões, fumaça e centelhas coloridas. Esta foi a base dos fogos de artifício – a imortalidade ficou para depois.
Na Europa, diversos alquimistas também tentaram encontrar o caminho para a eternidade – ou, ao menos, uma panaceia, um remédio indicado para todos os males. Evidentemente, todos os experimentos deram com os burros n’água. Em 1493, o explorador espanhol Ponce de León descobriu acidentalmente a Flórida: ele tentava encontrar a fonte da juventude, confiando em relatos de nativos da América Central.
Entre altos e baixos
Os pesquisadores Simon Rietveld, da Universidade de Amsterdã, e Ilja Van Beest, da Universidade de Tilburg (ambas na Holanda) propuseram um tratamento revolucionário para aliviar os sintomas da asma: andar de montanha russa.
Eles arregimentaram 25 voluntárias e as levaram para uns giros no brinquedo, sempre com a respiração monitorada. A conclusão foi espantosa: ao final de algumas voltas, o ritmo respiratório estava muito melhor do que no início do experimento. As voluntárias se alegraram com os resultados e tornaram-se divulgadoras naturais do estudo.
Havia um problema, no entanto. A sensação de bem-estar era comparada entre o início e o fim do passeio. Quando o carrinho começava a andar, mesmo, em baixa velocidade e antes da primeira queda, elas sentiam medo e a pressão sanguínea disparava. No final, livres da pressão, o estresse positivo e o ritmo cardíaco aumentavam, facilitando a entrada de ar nas vias aéreas. A sensação poderia ser obtida também com o sorvete preferido, uma relação sexual ou um passeio descontraído, mas nenhuma destas atividades oferece a cura para a asma.
Os dois pesquisadores foram agraciados em 2010 com o Prêmio Ig Nobel (um trocadilho entre o Prêmio Nobel e a palavra ignóbil), que é conferido para descobertas bizarras da ciência – no caso dos holandeses, no ramo da Medicina.
Outra descoberta bizarra da Medicina também valeu o Prêmio Ig Nobel alguns anos antes, em 1992. F. Kanda, E. Yagi, M. Fukuda, K. Nakajima, T. Ohta e O. Nakata, do Instituto Shiseido, de Yokohama, Japão (que faz pesquisas na área de cosméticos), fizeram uma descoberta brilhante: “pessoas que acreditam ter chulé realmente têm chulé; as que acham que não têm chulé, não têm”.
Esqueçam as bactérias que provocam o mau cheiro. O principal fator para o desenvolvimento do chulé é a própria consciência. O estudo premiado recebeu o pomposo nome de “Elucidação dos Componentes Químicos Responsáveis pelo Chulé”;
Trocando um dente pela visão
O inglês Ian Tibbetts, de 43 anos, cego havia 12 anos depois de sofrer um acidente de trabalho em que rasgou a córnea, recuperou a sua visão após um implante de parte de um dente e da mandíbula no olho desenvolvido na Itália. Tibbetts enxergava apenas sombras e formas desfocadas. Pela primeira vez, ele pôde ver seus filhos gêmeos.
Por que o dente? Porque o material é do próprio paciente, que, desta forma, não corre riscos de rejeitar o tecido. O procedimento é feito em duas partes: na primeira, o material a ser transplantado é retirado e uma lente especial é inserida no dente.
Na segunda etapa, quando o dente começa a criar tecido novo e desenvolver fluxo sanguíneo, a córnea é aberta para ligar o dente à órbita ocular, fazendo com que o paciente volte a enxergar. A cirurgia ainda é experimental e indicada para casos específicos. Apesar de bizarra, é um grande avanço para a oftalmologia. Nos EUA, a primeira cirurgia – chamada osteo-odontoqueratoprótese – foi realizada em 2013. Apenas 600 operações foram realizadas até hoje.
Um feto dentro do outro
São casos raros, mas podem acontecer. Estima-se que ocorra apenas um em cada 500 mil gestações e há ao menos cem casos registrados na literatura médica. Fetus in fetu, também chamado de feto parasita, é uma ocorrência na qual, em uma gravidez de gêmeos, um dos embriões – inviável ou mal formado – é absorvido pelo irmão com desenvolvimento normal.
Em geral, o gêmeo parasita se instala no abdômen ou na cavidade retroperitoneal (situada entre as lâminas do peritônio, membrana que envolve os intestinos). A maioria dos gêmeos inviáveis apresenta anencefalia, mas alguns deles podem desenvolver membros e a coluna vertebral. O desenvolvimento é comprometido por um defeito genético ou pela dominância do par normal.
O tratamento é considerado benigno, apesar de exigir procedimento cirúrgico para a remoção do feto parasita. Geralmente, a condição clínica é descoberta logo nos primeiros anos de vida (89% dos casos são descobertos antes de o bebê completar 18 meses).
Mas, em 2010, uma mulher de 30 anos, em Nagpur (Índia), foi diagnosticada com fetus in fetu, depois de várias investigações que excluíram a possibilidade de gravidez, problemas intestinais ou geniturinários. Aparentemente, o gêmeo parasita voltou a se desenvolver depois do nascimento do primeiro filho da paciente, afetado pelos hormônios liberados durante a gravidez.
“Síndrome de Cascão”
O personagem de Maurício de Sousa não é o único a ter medo de água. Recentemente, pesquisas médicas identificaram uma alergia bastante incomum: os portadores não podem ter qualquer tipo contato com água. Trata-se da urticária hidrogênica. Até 2013, o diagnóstico só havia sido oficialmente confirmado em 35 pacientes, em todo o mundo. Ao entrar em contato com água sob qualquer forma, os pacientes apresentam coceira intensa, que provoca vermelhidão e irritação na pele.
No caso de exposição prolongada – um banho repentino de chuva, por exemplo, que, para a imensa maioria das pessoas, só obriga a uma corrida até chegar ao ponto de ônibus ou a uma proteção qualquer – os portadores da alergia à água desenvolvem bolhas dolorosas, que podem causar sequelas permanentes, semelhantes a marcas de queimaduras. Situações para chorar de dor, mas este é um luxo que os pacientes não podem se dar.
O banho é uma situação especial: é preciso ensaboar pequenas partes do corpo de cada vez, em intervalos de apenas um minuto, seguidos de períodos de descanso, para se recuperar das dores. Beber água, só destilada (os pacientes são sensíveis aos íons presentes na água não destilada).
Uma jovem galesa de 26 anos precisou deixar o emprego. Ela era professora de dança em Flint (País de Gales), mas não suportou a forte reação alérgica provocada pelo seu corpo apenas com o suor. A maior parte dos portadores desta urticária fica permanentemente confinada em casa.
Mais Ig Nobel
Desta vez, o alvo dos pesquisadores foram as bonecas infláveis, companheiras inseparáveis dos solteiros e misóginos (que não se interessam por mulheres, sem necessariamente serem homossexuais). O nome desta investigação médica bizarra é bastante sugestivo: “Transmissão de Gonorreia através de Bonecas Infláveis – Antes que Você Pense que Estou Brincando, o Estudo Foi Publicado em 1993, no Genitourinary Medicine” (do Colégio Real de Médicos da Inglaterra).
O autor, que recebeu o prêmio em 1996, alertou em seu estudo para o perigo de compartilhar bonecas infláveis que possam estar infectados e reutilizá-las antes de uma esterilização adequada, fato bastante improvável – e mais bizarro do que a própria pesquisa. A menos que alguém tenha a ideia de criar o Clube das Bonecas Infláveis Compartilhadas.