Em 17 de novembro de 1903, os governos brasileiro e boliviano assinaram o Tratado de Petrópolis, que concedeu o território do Acre ao Brasil. Em 1877, teve início a chegada de grupos de migrantes, vindos especialmente da região Nordeste, atraídos pela exploração da borracha.
Em plena floresta Amazônica, uma região praticamente desabitada, em pouco tempo os brasileiros se tornaram maioria: no final do século XIX, 50 mil haviam se transferido para o Acre. Este contingente provocou, em pouco tempo, muitos conflitos com as forças militares bolivianas.
Em 1898, a Bolívia reagiu e avançou sobre o Acre – e sobre os brasileiros que exploravam a borracha na região. As ocorrências e litígios pontuais, envolvendo seringueiros brasileiros, tomaram forma de conflito internacional.
A borracha
As seringueiras nunca chamaram atenção das autoridades econômicas dos países ocupados (ao menos em parte) pela floresta Amazônica: Brasil, Bolívia, Colômbia, Peru, Equador, Venezuela, Suriname, Guiana e Guiana Francesa.
No entanto, os reflexos da Revolução Industrial começaram a chegar à América. A mudança no modo de produção passou a exigir outras matérias primas, além de mão de obra qualificada (o que marginalizou grandes grupos de indivíduos não especializados).
A borracha começou a ser empregada em larga escala na indústria, principalmente na fabricação de pneus para automóveis, motocicletas e bicicletas, graças à vulcanização, prática inventada pelo americano Charles Goodyear.
A ocupação
A seringueira deixou de ser apenas uma das árvores da mata, adquirindo o status de produto de interesse econômico. Uma lei da economia prevaleceu: quanto maior a procura, maior o preço. Deste modo, estabeleceu-se a “corrida da borracha”.
A migração de brasileiros para o norte da Bolívia não obedeceu a qualquer planejamento. A notícia sobre um grande número de seringueiras na região simplesmente atraiu agricultores e pecuaristas de baixa renda, que sonhavam com melhores condições de vida.
Os migrantes não respeitaram títulos de posse: simplesmente invadiram terrenos e fazendas, para dar início à exploração da borracha. Na verdade, porém, a Bolívia nunca exerceu a sua soberania sobre o Acre, uma região caracterizada pela floresta densa, praticamente inacessível. O local era ocupado por grupos esparsos de índios, sem identidade nacional.
Nos mapas da época, as terras entre os rios Javari e Madeira eram identificadas como “tierras non descubiertas”. Descendentes dos incas, os bolivianos, que habitavam o altiplano, não conseguiam se habituar a viver na planície.
A revolução
A Revolução Acreana, também conhecida como Guerra do Acre, teve início em julho de 1899. Foi apenas uma revolta da população local contra os abusos das autoridades da Bolívia, mas gerou consequências importantes para a região.
O estopim do conflito foi a fundação, por parte da Bolívia, Puerto Alonso (atual Porto Acre), então na fronteira entre os dois países. O município ficava na passagem do látex dos produtores acreanos para o Brasil, mas os bolivianos estabeleceram um posto aduaneiro, complicando o transporte (ilegal, mas largamente praticado).
Sob o comando de Luís Galvez e José Plácido de Castro, os revoltosos proclamaram a “República do Acre”, um Estado que, se reconhecido, não conseguiria reunir condições econômicas para sobreviver e desenvolver-se. Os brasileiros conseguiram rechaçar as tropas da Bolívia e mantiveram o controle do território durante quatro anos.
A República do Acre foi proclamada em três momentos diferentes, mas só recebeu o reconhecimento por parte do Brasil. Além da Bolívia, o Peru também tinha interesse em conquistar o território e os recursos naturais ali existentes.
Bolivian Syndicate
No início do século XX, a Bolívia estava ansiosa por resolver a questão da exploração do látex. Ao mesmo tempo, ceio à tona a notícia de um acordo militar entre americanos e bolivianos, o que colocou as autoridades brasileiras em estado de alerta.
Em 1901, as terras do Acre foram arrendadas por 30 anos para um sindicato capitalista, constituído principalmente por ingleses e americanos. Para a Bolívia, os problemas de administração do território estavam resolvidos: o Bolivian Syndicate assumiria controle total, incluindo segurança alimentar e controle alfandegário.
Resposta brasileira
O Brasil, no entanto, não ficou nada satisfeito com a negociação boliviana. Contudo, as tratativas diplomáticas brasileiras para anular o contrato, que feria a soberania de dois países, enfrentaram dura reação de Londres e Washington.
Em resposta, o então presidente Campos Sales determinou o fechamento do rio Amazonas e seus afluentes para a navegação de embarcações estrangeiras, fato que provocou protestos (formalmente ignorados) da Inglaterra, EUA, França e Alemanha.
As divisas entre Brasil e Bolívia haviam sido fixadas em 1863, com a assinatura do Tratado de Ayacucho. No entanto, o então ministro das relações exteriores brasileiro, José Maria da Silva Paranhos (o barão do Rio Branco), decidiu interpretar o tratado ao pé da letra e chegou à conclusão de que as terras do Acre estavam em litígio.
O ministro apresentou uma proposta de compra ou permuta do Acre, inclusive assumindo o ônus de negociar com o Bolivian Syndicate. A Bolívia, no entanto, que acreditava em um apoio militar dos EUA, rechaçou a proposta.
Pacificação
Em 1903, com a assinatura do Tratado de Petrópolis, a Bolívia perdeu território pela segunda vez. Entre 1879 e 1883, o Chile guerreou contra Peru e Bolívia. Ao final do confronto, quase metade do território boliviano (inclusive a saída para o mar) foi tomada pelos chilenos.
Com a assinatura do tratado, a ideia de proclamar uma república no Acre foi engavetada. Afinal, os brasileiros estavam extraindo látex em território brasileiro e não precisavam mais se preocupar com ataques e confiscos.
O cavalo
Um boato histórico afirma que a Bolívia trocou o Acre por um cavalo. Este fato é esporadicamente explorado para demonstrar como o “Brasil imperialista” obrigou o país vizinho a ceder terras com viabilidade econômica.
Na verdade, com o Tratado de Petrópolis, o Brasil pagou uma indenização considerável, cedeu terras e também cavalos – foram dois – apenas uma bonificação para acelerar as negociações diplomáticas. Alguns historiados, porém, não aceitam a ideia de que os cavalos fizeram parte da história – mesmo porque os equinos não se adaptam bem a altitudes muito altas.
A “compra” do Acre envolveu uma indenização de dois milhões de libras esterlinas (a moeda padrão da época), a cessão de alguns territórios do Mato Grosso e o compromisso de construção da estrada de ferro Madeira-Mamoré, que serviria como parte do acesso boliviano ao oceano Atlântico.